O Diagrama Sistémico de Borboleta (Butterfly Diagram) é uma metodologia criada pela Ellen MacArthur Foundation que auxilia na aplicação prática da economia circular em todos os setores da economia.
Esta metodologia está assente nos três princípios básicos da economia circular:
“Preservar o capital natural”, promovendo uma utilização eficaz dos recursos finitos e equilibrando a utilização dos recursos renováveis (Topo da imagem).
Potenciar a utilidade dos produtos, componentes e materiais, mantendo-os a circular na Economia até ao limite da capacidade (Meio da imagem).
Desenvolver sistemas eficazes que minimizem o volume de resíduos que terminam em aterro e as externalidades negativas (Base da imagem).
Segundo a imagem, podemos notar que existem dois tipos de nutrientes: do lado esquerdo temos os nutrientes biológicos, que incluem os recursos renováveis da natureza. Já do lado direito, temos os nutrientes tecnológicos, que utilizam recursos não renováveis, ou seja, que são finitos na natureza.
Como é que o diagrama de borboleta pode ajudar as empresas do sector agroalimentar a transitarem para a Economia Circular?
Com o intuito de auxiliar as empresas do setor agroalimentar a fazerem a transição para um modelo regenerativo e circular, selecionamos algumas das principais práticas que irão garantir a sustentabilidade económica, social e ambiental, trazendo benefícios para todas as partes envolvidas.
Para facilitar o entendimento e seguindo o modelo do diagrama de borboleta, dividimos estas boas práticas em quatro grandes tópicos:
1. Produção e Escolha das Matérias-primas
No topo do diagrama de borboleta, podemos observar que é dado enfoque a alguns pontos como a regeneração dos sistemas naturais e a substituição dos materiais.
Para assegurar a renegeração dos sistemas, é essencial garantir que a produção é realizada em harmonia e simbiose com os sistemas naturais, respeitando os seus ciclos.
A adoção de práticas assentes na agricultura regenerativa ou a procura por implementar sistemas de produção de baixo impacto ambiental, como é o caso de vários métodos de produção tradicionais, podem ser caminhos para se alcançar este objetivo.
Na substituição dos materiais, deve ser dada prioridade à escolha de matérias-primas seguras, saudáveis e abundantes localmente, considerando o seu impacto para o meio ambiente e a saúde das pessoas. Deve-se valorizar, sempre que possível, a reutilização das matérias-primas, dando prioridade à utilização das que já estão a circular na economia.
Esta boa prática permite aumentar o ciclo de vida, além de reduzir as emissões de CO₂ e o uso de energia e água. Assim, reduz-se a necessidade de extrair materiais virgens da natureza para produção de novos produtos e os resíduos que serão descartados em aterro.
Exemplo de empresa
A Loop é uma empresa canadiana situada no Quebec, que encontrou uma ótima solução para potenciar a utilização dos alimentos, tendo como missão reduzir o desperdício alimentar.
A empresa reaproveita frutas, legumes, óleos alimentares e pães em risco de serem desperdiçados, para criar inúmeros produtos, como: sumos, cervejas, gins e sabonetes.
Site da empresa: https://loopmission.com/
2. Energia Renováveis
O topo do diagrama da borboleta destaca as energias renováveis, que vai de encontro com o primeiro princípio básico da economia circular de "preservar o capital natural", o qual alerta para a utilização eficaz dos recursos não renováveis (finitos).
A utilização de energias renováveis, que advém de recursos naturais disponíveis de forma abundante na natureza (como o sol, o vento, a chuva e as marés), são extremamente importantes quando pensamos em melhorar a qualidade de vida das pessoas e causar um menor impacto no meio ambiente e no planeta em geral.
Optar pela instalação de microturbinas eólicas e painéis fotovoltaicos (sejam nos telhados, quintais ou terraços) é uma boa prática para produzir energia verde e renovável e ainda, diminuir os gastos com energia. Assim, conseguimos crescentemente promover o restauro dos stocks dos recursos finitos, através redução da dependência de recursos como o carvão ou o petróleo.
Quando este tipo de investimento não é viável, pode-se procurar apoiar a transição energética através da escolha do fornecedor, optando por operadores que tenham disponíveis pacotes, onde a energia consumida seja maioritariamente ou exclusivamente, de fontes renováveis.
Exemplo de empresa
Situada em Vila Velha de Rodão, no distrito de Castelo Branco, a empresa de presuntos “Presuntos Rodrigues”, desde 1925 comercializa os seus produtos em Portugal e também fora do país.
Em 2021, a empresa lançou uma campanha na plataforma GoParity com o objetivo de criar uma central fotovoltaica para diminuir os custos por parte do cliente final, bem como reduzir a emissão de CO₂.
Site da empresa: http://www.presuntosrodrigues.com/o-presunto.html
3. Água
É importante destacar que o primeiro princípio que rege a economia circular, o qual está evidenciado no topo do diagrama sistémico de borboleta é a "preservação do capital natural", de forma a equilibrar o uso dos recursos renováveis do planeta. A água é um dos bens mais preciosos da humanidade, e embora seja considerada um recurso natural renovável, a utilização não responsável desse bem tem trazido sérios problemas para a sociedade e o planeta.
O uso consciente e sustentável da água deve ser priorizado por todas as áreas de negócios que almejam fazer a transição para a economia circular, colaborando assim, com o meio ambiente, a sociedade e a economia.
Um exemplo de boa prática é a introdução de sistemas que permitam potenciar e assegurar o fecho do ciclo da água, como é o caso do investimento em sistemas que permitam reutilizar a água das lavagens da frutas, vegetais ou outros alimentos.
Exemplo de empresa
A Raíz Cuadrada é uma empresa de cerveja artesanal que está situada na cidade espanhola de Ávila. Além de criar os seus produtos através de restos de pães recolhidos das padarias, esta empresa reaproveita água da refrigeração para lavagens.
Outra ação circular é que o excedente do bagaço resultante da produção de cervejas é encaminhado para alimentação de animais.
Site da empresa: https://cervezaraizcuadrada.com/
4. Circularidade dos Componentes
Dependendo da sua natureza, existem diferentes estratégias de modo a promover a circularidade dos produtos e materiais. As estratégias para promover a circularidade dos componentes técnicos são distintas das estratégias associadas aos componentes biológicos sendo, por esta razão, importante evitar a mistura de materiais que impeça a separação e o encaminhamento para o ciclo correto.
Assim, iremos então dar alguns exemplos de boas práticas para a promoção da circularidade dos componentes técnicos e biológicos.
Circularidade dos Componentes Técnicos
No lado direito do diagrama de borboleta destacam-se os nutrientes técnicos (recursos finitos), que estão subdivididos em algumas categorias que permitem uma crescente circularidade dos componentes técnicos, tais como: a partilha, a reutilização, a remanufactura, o restauro e a reciclagem.
Assim, para promover a circularidade dos componentes técnicos no sector agroalimentar, existem 3 pontos que merecem uma especial atenção: as embalagens, os equipamentos e a infraestrutura.
Embalagens
No meio do diagrama de borboleta, podemos observar que a opção reutilizar/redistribuir está intimamente relacionada com o segundo princípio da economia circular: "potenciar a utilidade de produtos, componentes e materiais, mantendo-os a circular na economia até ao limite de sua capacidade." É, portanto, nesta categoria que a circularidade das embalagens deve ser promovida. O uso de embalagens descartáveis (sejam de plástico, papel ou alumínio) gera uma imensa quantidade de resíduos para o planeta, que infelizmente foi potencializada pela pandemia.
Uma das alternativas com maior impacto neste ponto e que já está a ser utilizada por diversas empresas do setor alimentar, é introdução de soluções que permitam aos clientes reutilizar as embalagens. Esta opção faz com que a produção de novas embalagens seja evitada, e fomenta o reuso das mesmas, resultando na maior circularidade destes materiais. Neste ponto, sublinhamos a iniciativa "Take it" da associação ZERO, que incentiva a restauração a permitir que os clientes tragam as suas próprias embalagens, na compra de produtos para take away.
Além da reutilização, existem outras estratégias que permitem uma crescente circularidade das embalagens como a eliminação e a circulação dos materiais, que são exploradas a fundo no relatório da Ellen MacArthur Fundation “Inovação na origem” (2020).
Exemplo de empresa
Nascida em 2015, a Maria a Granel é a primeira "zero waste store" de Portugal, que tem o propósito de ajudar a reduzir o desperdício e a eliminar o plástico descartável.
Com a missão de alertar para o consumo responsável e sustentável, atualmente a empresa possui duas lojas em Lisboa, onde comercializa diversos produtos biológicos alimentares, não alimentares e acessórios.
Site da empresa: https://www.mariagranel.com/
Além do exemplo mencionado acima, o site A Granel é um directório que reúne as lojas que vendem produtos neste modelo em Portugal continental e ilhas.
Equipamentos
No meio do diagrama de borboleta, a alternativa de reutilização/redistribuição dos componentes técnicos é a mais indicada quando pretendemos assegurar a circularidade dos equipamentos utilizados no setor agroalimentar. Algumas das boas práticas de ações circulares na aquisição de equipamentos do setor agroalimentar (panelas industriais, fritadeiras, chapas, máquinas de lavagens, etc.) é o leasing, onde se aluga algo por um tempo determinado. No entanto, se for necessário comprar estes equipamentos, pode-se optar por adquiri-los em lojas de segunda mão.
Aliado ao segundo princípio da economia circular, ou seja, "manter os materiais a circular na economia até ao limite da capacidade", para estender o tempo de vida útil dos equipamentos, é importante saber se os fornecedores possuem algum serviço de manutenção para verificar o bom funcionamento dos equipamentos, bem como um sistema de retoma, seja para remanufaturar ou para dar o reencaminhamento adequado a estes equipamentos quando eles forem substituídos.
Exemplo de empresa
A Rnters é uma plataforma que permite aos utilizadores alugar os mais variados produtos.
Desta forma, os donos dos produtos podem gerar um rendimento com pouca utilização, e quem aluga pode aceder a produtos que precisam por um período limitado, por um preço mais competitivo do que a aquisição.
Site: https://rnters.com/
O site Em Segunda Mão é um directório que reúne as lojas que vendem produtos usados em Portugal. Ao adotar este modelo circular, pode-se economizar muito e reduzir a pegada ecológica.
Infraestrutura
Assente no segundo princípio da economia circular, que propõe potenciar a circularidade de produtos, materiais e componentes, mantendo-os a circular na economia pelo maior período de tempo, no meio do diagrama de borboleta observa-se a alternativa de reutilizar/redistribuir.
Posto isto, na parte da infraestrutura para as empresas agroalimentares, as cozinhas partilhadas são as melhores opções que podemos citar de boas práticas, isso para aqueles negócios que ainda não possuem um espaço físico.
Neste modelo, paga-se um valor para alugar estes espaços que já oferecem toda a infraestrutura necessária para trabalhar.
Se, no entanto, esse não for o caso, deve-se pensar na arquitetura do local para que esta possa ser o máximo sustentável e bioclimática. A escolha de materiais que assegurem um bom isolamento, pode evitar perdas de calor desnecessárias. Além disso, e não menos importante, deve-se aproveitar ao máximo a incidência de luz e ventilação naturais do local.
Exemplo de empresa
Fundada em 2016, a Cozinha Partilhada de Alfazina está localiza em Almada, na região de Lisboa. Esta cozinha está totalmente equipada para o uso de micro e pequenas empresas do setor alimentar e que não possuem um espaço para trabalhar.
Por um aluguer mensal de 125 euros, as despesas de água, eletricidade e limpeza dos equipamentos estão incluídas.
Site da empresa: https://cozinha-partilhada-de-alfazina.negocio.site/
Circularidades dos Componentes Biológicos
Para um modelo de negócio circular, na parte dos nutrientes biológicos, indicados na parte esquerda do diagrama de borboleta, deve-se considerar os produtos, subprodutos e compostagem.
Produtos
No meio do diagrama de borboleta, a agricultura é um dos pontos a se ter atenção no setor agroalimentar. A escolha dos produtos, neste caso, dos alimentos que serão utilizados pelas empresas, possuem um grande impacto no meio ambiente e na saúde dos consumidores.
Deve-se preferir a compra de produtos locais, orgânicos e biológicos que não utilizam pesticidas no seu desenvolvimento. Com o intuito de minimizar perdas sistémicas e externalidade negativas - que compõe a base do diagrama de borboleta - pode-se optar por adquirir frutas, legumes e vegetais que seriam descartados pelas grandes superfícies por, por exemplo, não apresentarem os parâmetros exigidos, como a cor, o tamanho, etc.
Importante notar que este último ponto vai de encontro com o terceiro princípio da economia circular, que propõe minimizar o volume de resíduos que terminam em aterro e reduzir as externalidade negativas.
Exemplo de empresa
A Kitchen Dates é o primeiro restaurante zero waste de Portugal. A comida produzida reaproveita tudo dos alimentos transformando-os em verdadeiros pratos gourmets.
Infelizmente, o Kitchen Dates não resistiu à pandemia, mas todo o trabalho que fizeram continua a ser um exemplo e inspiração. Atualmente, os donos organizam workshops e oferecem serviços de catering, mentoria e consultoria para pessoas ou organizações.
Site da empresa: https://kitchendates.pt/
Subprodutos
Na base do diagrama de borboleta, podemos observar que existem duas questões muito importantes e que devem ser analisadas de maneira profunda pelo setor agroalimentar: minimizar perdas sistémicas e externalidades negativas. Aliado a isso, destaca-se o terceiro princípio norteador da economia circular: "desenvolver sistemas eficazes que minimizem o volume de resíduos que terminam em aterro e as externalidades negativas."
Assim, é importante que as empresas do setor agroaliementar deem mais atenção a valorização dos subprodutos gerados durante o processo de produção, para que os recursos que já estão a circular na economia sejam reaproveitados ciclicamente para diversos fins, consoante a sua aplicabilidade.
Note que em quase em todos os processos agroalimentares são criados subprodutos que seriam descartados sem que o seu potencial fosse analisado de maneira mais profunda, o que gera um grande desperdício para o planeta. Portanto, dependendo do foco do negócio, deve-se analisar como pode-se reaproveitar os resíduos para, por exemplo, gerar novos produtos.
Exemplo de empresa
A Kaffe Bueno é uma empresa dinamarquesa localizada em Copenhaga e que produz diversos produtos através das borras de café recolhidas dos comércios locais.
Os fundadores descobriram que numa chávena de café estavam apenas 1% dos componentes que melhoram a saúde e que os outros 99% eram descartados. Hoje em dia, a empresa comercializa produtos, tais como o óleo e a farinha de café.
Site da empresa: https://www.kaffebueno.com/
Compostagem
O conceito de minimizar perdas sistémicas e externalidades negativas está evidenciado na base do diagrama de borboleta, bem como no terceiro princípio da economia circular que propõe, entre outras coisas, minimizar a quantidade de resíduos que terminam em aterro, evitando assim, o aumento de gases nocivos no planeta e o empobrecimento dos solos.
Todos os negócios do setor agroalimentar produzem muitos resíduos que são descartados indevidamente e que terminam em aterros sanitários, sejam cascas, caroços, restos de comidas de clientes. Esse processo tem um grande impacto negativo no planeta, pois provoca o aumento de gases de efeito estufa.
Para minimizar o desperdício, pode-se optar por um compostor no local e os resíduos que forem criados podem nutrir os solos de hortas ou plantações. Além disso, pode-se criar receitas circulares que consigam aproveitar tudo dos alimentos, uma vez que o que descartamos, muitas vezes, tem nutrientes necessários para o bom funcionamento do corpo humano.
Exemplo de empresa
A MudaTuga é uma startup que tem como intuito sensibilizar a população para a importância da compostagem, disponibilizando à comunidade vários recursos educativos.
A empresa foi responsável pela criação de um compostor comunitário em Coimbra, e tem atualmente em pré-venda um compostor Bokashi, workshops DIY, entre outros produtos.
Site da empresa: https://www.mudatuga.com/
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Autoras:
Mariana Pinto e Costa (Co-fundadora BeeCircular)
Daniela Diana (Estagiária de Marketing e Comunicação)
Contacte-nos: hello@beecircular.org
Fontes:
*Imagens retiradas do wix
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